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Um retrato da negritude e o direito de ocupar espaços

Crítica: Emicida - Amarelo, É Tudo Pra Ontem (2020)

Anna Clara


“Exu matou um pássaro ontem com uma pedra que só arremessou hoje”, é assim que Emicida começa seu documentário, com esse dito Iorubá, que mostra a subversão do tempo nas mãos do orixá, adaptando a frase para o esforço diário de reinterpretar o passado e reinventar a memória, assim como faz Exu.

AmarElo é um projeto que ao mesmo tempo que se mostra profundamente íntimo, se torna completamente simbólico, com a jornada que o músico faz na história do povo negro, nas suas lutas sociais, conquistas e contribuições que a cultura da negritude trouxe na construção da cultura brasileira. Explora a jornada e desempenho do samba e de seus principais contribuidores (em sua maioria pessoas negras) como símbolo nacional que foi por muito tempo marginalizado por conta de sua origem periférica, e sua ascensão internacional.

A escolha do local de gravação do documentário, o Theatro Municipal de São Paulo, tem em si um significado simbólico, de ocupação do povo negro em espaços que lhe foram proibidos por tanto tempo. Assim, ele torna aquele lugar que é um dos símbolos culturais da cidade, acessível a várias famílias de periferia, e até mesmo vários artistas negros e suas famílias que nunca pisaram naquele lugar antes.


Particularmente nunca fui muito interessada em gravações de álbuns, porém, a forma com que Emicida torna a produção um retrato da luta por conquista das pessoas marginalizadas, como ele mesmo foi um dia, é feita de maneira muito inspiradora e comovente. Agregada à jornada histórica, feita de maneira didática, de fatos que eu mesma desconhecia, personalidades negras fundamentais pra luta pela igualdade e pela identidade cultural brasileira, a experiência acaba se tornando positivamente agregadora na jornada de conhecimento a respeito da discussão da pauta racial, um assunto polêmico, porém profundamente necessário.


O subtítulo da obra “é tudo pra ontem” faz referência a frase dita no início, “Exu mata um pássaro ontem com uma pedra que ele só arremessou hoje”, a qual o cantor usa como uma metáfora a luta do povo negro por suas conquistas. A luta é demorada e já tem mais de 100 anos, por isso a pressa pela mudança, para que as pessoas que lutam pela igualdade consigam usufruir dela coletivamente, pois a maior força de uma comunidade é a própria união de seus membros, nas palavras de Emicida “tudo o que nós tem, é nós”.


Nota: 5/5 Lágrimas


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