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O veredito midiático

Crítica: Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil ( 2021 )

Julia Alfa


No mês de fevereiro de 2021, a Netflix lançou o documentário seriado Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil. Ao longo de quatro episódios, é contada a história da canadense Elisa Lam, que desapareceu no Hotel Cecil durante sua estada. Com o caso de desaparecimento e morte popularizado na internet desde 2013, o documentário true crime propunha narrar o mistério de seu início à sua solução.


Com a divulgação midiática do “enigma” de Elisa Lam, a proposta do documentário facilmente atraiu espectadores curiosos e fãs de produções do gênero. Contando com a boa produção de Ron Howard e uma premissa instigante, nos levando a conhecer a realidade de Los Angeles, a série consegue prender a atenção dos espectadores a cada episódio. É impossível deixar de pontuar, entretanto, que Cena do Crime falha diretamente com os desafios epistemológicos e éticos que enfrentam os documentaristas na realização do trabalho.


O conteúdo seletivo da informação difundida na internet fez com que milhares de internautas divulgassem o caso como um mistério nunca solucionado, quando, na verdade, o caso está fechado há mais de 5 anos: por consequência da má ministração de seus remédios para o controle do transtorno bipolar e depressivo, Lam enfrentou um episódio de mania que terminou, tragicamente, em sua morte.


Na contramão de desmistificar as teorias mirabolantes criadas online, o documentário passa três episódios inteiros discorrendo sobre as mesmas. Inclusive, são convidados para a participação da série indivíduos que fizeram parte de grupos que debateram essas suposições, ou mesmo criaram algumas. Inconvenientemente, Cena do Crime te convida a conhecer essas ideias impertinentes e considerar sua veracidade.


No quarto e último episódio, é revelada a parte policial; o resultado do legista, da autópsia, a conclusão do caso. Uma informação que deveria ser entregue desde o início como certeza é deixada para o final, ainda com possibilidade de contradição. A polícia está falando a verdade? Estão tentando esconder alguma coisa? Devo acreditar nisso?


A morte de Elisa Lam virou ponto turístico, na mais descabida literalidade. Desconhecidos visitaram o local de sua morte; visitaram mesmo seu túmulo. Pessoas foram perseguidas, atacadas e ameaçadas pelos detetives virtuais. E, ainda assim, eles tiveram horas de palco para que pudessem compartilhar suas ideias danosas mascaradas por exagero de empatia a respeito da morte de uma jovem anônima.


A forma que a história foi apresentada no documentário foi desrespeitosa. Os distúrbios psicológicos de Elisa Lam foram invisibilizados para dar lugar à imaginação de qualquer um que quisesse solucionar o caso em frente ao computador. E, ao finalizar os quatro episódios na série, você ainda pode escolher acreditar em alguma teoria.


Os realizadores de Cena do Crime podem até ter tentado deixar a mensagem de que atitudes como aquelas eram erradas, mas se perderam em algum momento entre o tratamento do tema e o formato de exibição. É uma pena. A história de Elisa Lam pode ter sido um mistério curioso por um período de tempo, mas ele está solucionado. Ele já recebeu um ponto final. Pelo bem da família da jovem e de sua memória, que a internet a deixe descansar em paz.


Nota: 1.5/5 Lágrimas


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