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Retrato irônico, introspectivo e metalinguístico dos efeitos do confinamento em obra de Bo Burnham

Crítica: Bo Burnham - Inside (2021)

Arthur Pereira


O filme dirigido, escrito, estrelado, filmado, editado e com músicas compostas e gravadas por Bo Burnham é a nova aclamada adição ao catálogo da Netflix: Bo Burnham: Inside é um primor em todos os aspectos técnicos e imaginativos, uma vez que o artista americano, que completou 30 anos durante a realização do longa, recorre a soluções criativas, brilhantes e engraçadíssimas para superar as limitações de uma produção realizada em isolamento. Um exemplo dessa engenhosidade é a utilização de risadas gravadas para completar os vazios do texto cômico, já que a produção é um especial de comédia sem público; assim, aproveitou-se da ausência de um mecanismo básico da apresentação ao vivo e reconstruiu-o como artifício humorístico.


Entretanto, chamá-lo de especial de comédia ou documentário talvez seja um erro. O conceito estético alemão Gesamtkunstwerk (ou obra de arte total) resume bem a conjugação de música, teatro, canto, dança e artes plásticas em uma só obra. Essa integração de diferentes formas de expressão artística é muito presente na Sétima Arte e os exemplos são incontáveis, mas, aqui, Bo Burnham proporciona ao público uma variedade de elementos associada a uma imersão profunda do espectador, mesmo sem uma linha cronológica narrativa bem clara.


Desde o início da carreira, começada no Youtube em 2006, Bo Burnham utiliza da música, performances e o tema recorrente da relação artista-audiência para construir humor e (auto)críticas. As inteligentes e satíricas letras das músicas, também vistas nos brilhantes What. (2013) e Make Happy (2016) - e ainda o roteiro real e relacionável do longa de ficção dirigido por Bo: Eighth Grade (2018) -, são um dos pontos altos de toda a experiência. Além disso, a composição musical por trás delas é realizada com excelência e a maioria das canções ficam na mente do espectador muito tempo após a rodagem. A fotografia, auxiliada por uma grande variedade de luzes administradas pelo próprio artista, é fantástica, transitando perfeitamente entre a contemplação (sempre da mesma locação única do estúdio caseiro) e o humor.


Assim, a obra confessional, jornalística (ocupando uma posição ilustre como retrato da rotina e degradação psicológica durante o período de isolamento devido a pandemia do corona vírus) e com mudanças tonais funcionais flui como uma peça teatral bem escrita, entrecortada por momentos em que Bo assiste as próprias filmagens. Já a bagunça e a grande quantidade de objetos largados pelo cenário compõem a construção artística do filme, pois a mente do artista estava exatamente daquela forma durante todo o processo de concepção que acompanhamos: um personagem lentamente perdendo o contato e as amarras com a realidade.


Diante disso, Bo Burnham: Inside incorpora uma grande diversidade de gêneros fílmicos (comédia, drama, documentário, esquetes, stand-up comedy), correntes artísticas (música e teatro) e estilos/recursos estéticos (metacomentário - Bo constantemente para de dizer algo que estava falando a fim de comentar sobre aquilo que ele vai dizer, falando sobre o assunto de forma abstrata - e edições que fazem referência a redes sociais como Youtube e Twitch), entregando uma das melhores, senão a melhor, “obra da pandemia” até então.


Nota: 5/5 Lágrimas

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