Crítica: Palm Springs
Arthur Pereira
A maior aquisição da história do Festival de Sundance (Utah/Estados Unidos), com mais de 17,5 milhões de dólares pagos pela Neon, distribuidora do clássico instantâneo Parasita (2019), Palm Springs foi um projeto que começou no segundo ano da faculdade de cinema. O diretor Max Barbakow e o roteirista Andy Siara bancaram a ideia mesmo com a saturação do tema do filme nos últimos anos (o que poderia fazer com que o longa nunca fosse concebido) e trouxeram grandes atores, como Adam Samberg (que também produz o longa), Cristin Milioti, Peter Gallagher e J.K. Simmons, para debutarem e realizarem essa divertida e leve produção.
Palm Springs teria distribuição nas salas de cinema e poderia ser um sucesso de bilheteria na janela das férias de julho, mas a conjuntura atual já o levou para apreciação na plataforma de streaming Hulu. Para esse longa-metragem sugiro assisti-lo sem saber nada sobre o filme, tendo uma experiência completamente inédita, já que a sinopse e o trailer (e essa crítica) podem entregar elementos valiosos da trama. Entretanto, vamos para a crítica.
O filme conta a história de Nyles e Sarah, dois convidados de um casamento que acabam presos em um loop temporal. A premissa que a princípio pode parecer saturada e familiar já vista em Feitiço do Tempo (1993), de Harold Ramis, A Morte Te Dá Parabéns (2017), de Christopher B. Landon, ou até na brilhante série da Netflix Boneca Russa (2019), se sustenta na criatividade das decisões e competência na execução. Os próprios realizadores admitem a grande influência do clássico estrelado por Bill Murray na criação de um filme do gênero comédia com elementos de ficção científica (sem nunca se aprofundar demais na temática, deixando a narrativa o mais simples e objetiva possível).
Entretanto, Max Barbakow se afasta dessas inspirações ao colocar um protagonista que já está preso no loop temporal há muito mais tempo do que acompanhamos, sendo que a inicial estranheza causada no espectador ao ver Adam Samberg usando roupas praianas em um casamento, não se preocupando com nada e flertando com outra mulher mesmo sendo comprometido, se explica ao entender o contexto em que ele está vivendo. Preso em uma festa (casamento do dia 9 de novembro) que ele não queria estar e já tendo enfrentado o mesmo casamento em milhares de formas diferentes, nada mais importa para o personagem. Através disso, o diretor apresenta reflexões sobre rotina e niilismo que perpassam pela trama.
A dinâmica entre o carismático astro de Brooklyn Nine-Nine e a divertidíssima e já conhecida por muitos fãs de How I Met Your Mother é perfeita. A relação dos personagens desenvolvida inteiramente dentro do loop é sustentada pela química dos atores e por um ótimo texto que brinca com a ideia de imortalidade e a inexistência de consequências naquela realidade. Ademais, J.K. Simmons entrega um dos personagens mais divertidos de sua carreira. A fotografia de Quyen Tran é diferente do que é visto normalmente em filmes do gênero, com um estilo próprio e uso de lindos planos verticais; a montagem de Andrew Dickler e Matt Friedman auxiliando nas quase sempre certeiras piadas do filme e uma trilha sonora envolvente com destaque para as duas músicas do ex-Velvet Underground, John Cale, têm papel fundamental na trama.
Diante disso, os elementos reciclados na melhor comédia romântica de 2020 (por enquanto) fazem o filme se sustentar de forma totalmente agradável, se desvencilhando de possíveis comparações com outros longas. Um roteiro inventivo, uma direção competente e um elenco carismático fazem de Palm Springs uma opção perfeita para esse ano angustiante que é 2020. Uma história de amor profunda, recheada de ironia, mas que vista na superfície também funciona como uma leve e cômica experiência. Após os noventa minutos de rodagem, o que resta é a esperança de assistir outros clichês e se divertir tanto quanto nesse. Infelizmente é muito raro isso acontecer.
Nota: 4/5 Lágrimas

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